O avanço da medicina trouxe inúmeros ganhos para os pacientes. Entre eles está o aperfeiçoamento do diagnóstico dos distúrbios do movimento que podem estar presentes o quadro de doenças raras.
Antes do aprofundamento necessário no assunto, vale explicar que distúrbios do movimento são um conjunto de desordens neurológicas que levam o paciente a realizar movimentos involuntários, exagerados e intensos, podendo ser contínuo ou episódico. Estes movimentos podem afetar um ou mais segmentos, como cabeça, tronco, braços e pernas.
Entenda a relação entre epilepsia e os distúrbios do movimento
Hipócrates, considerado o pai da medicina, estudou a epilepsia e chegou à conclusão de que se trata de uma disfunção cerebral. Em outras palavras, a epilepsia ocorre porque os impulsos elétricos e os sinais químicos responsáveis pela comunicação entre os neurônios se comportam de forma desordenada, ocasionando uma crise epiléptica. Conhecemos algumas de suas causas, como má formação cerebral, erros inatos do metabolismo, infecções congênitas, problemas pré, peri ou pós parto, paralisia cerebral, tumores cerebrais, doenças genéticas, entre outros. A depender da região cerebral que sofre um agravo, a mobilidade do paciente pode ser afetada, originando, assim, os distúrbios do movimento. Estes, por sua vez, podem ser do tipo distonia, coreia, atetose, balismo, bruxismo, mioclonia, tremor, entre outros.
Hoje, um dos maiores desafios quando relacionamos epilepsia e distúrbios do movimento é a identificação de quando se trata de um ou de outro. A epilepsia, por exemplo, pode causar movimentos tônicos, clônicos, atônicos, enquanto que nos distúrbios do movimento a distonia é a mais frequente. Em ambos, epilepsia ou distúrbio do movimento, as alterações oculares (crises de desvio ocular) são comuns.
Epilepsia e distúrbios do movimento: Diagnóstico
Os três elementos que fazem a diferença no diagnóstico mais assertivo do paciente são: observação, história clínica e exame neurológico.
Observar o paciente desde o momento que ele entra no consultório até o momento de ir embora nos permite identificar aspectos característicos. O movimentar das mãos e dos pés, a postura enquanto está sentado, o deitar. Quando olhamos com atenção para esses detalhes, adquirimos uma nova percepção. Para isso, é extremamente importante que o neurologista esteja familiarizado com os conceitos sobre distúrbios do movimento, pois o reconhecimento de características específicas pode estar nas sutilezas de um detalhe que outrora passou despercebido.
Por exemplo, se o especialista não tiver bagagem a respeito das alterações de movimento, uma crise oculogírica (desvio ocular que é uma reação distônica) pode ser facilmente confundida com uma crise epiléptica. A diferença entre elas se deve ao fato de que o paciente não perde a consciência dos acontecimentos a sua volta durante um episódio distônico. Ele entende o que se fala, mas não consegue desfazer aquela postura. Febre, taquicardia, rubor e sudorese também podem vir acompanhando uma crise oculogírica.
Além disso, é importante trabalhar a história clínica. Por diversas razões os pacientes optam por mudar o especialista que os acompanha. Ao longo desse processo, muitas informações podem ser perdidas e/ou ignorada. A fim de alcançarmos um diagnóstico satisfatório, retomar questionamentos e avaliações pode proporcionar uma nova descoberta que culminará em um tratamento mais eficiente.
O exame físico geral e neurológico trazem provas físicas que complementam a observação e corroboram para um diagnóstico específico. Por exemplo, você sabia que o aumento do baço e do fígado remetem a algumas doenças genéticas? É no momento da realização deste exame que notamos esta alteração.
Exames para diagnóstico: Exoma e painel multigênico personalizado (NGS)
Para auxiliar no diagnóstico de doenças raras associadas a distúrbios do movimento, atualmente existem exames genéticos específicos: o paineis que avaliam vários genes por meio de sequenciamento de última geração (os mais comuns para aquele grupo de doenças) e o exoma.
O painel de distúrbios do movimento é gratuito. Ele avalia 91 genes (temos mais de 100 descritos) que detectam síndromes que cursam tanto com epilepsia quanto com distúrbios do movimento. Para realização, nós temos acesso a um kit que nos permite coletar os materiais do paciente no próprio consultório por meio de swab (uma espécie de “cotonete grande”) passado na região interna da bochecha. Já o exoma permite sequenciar todas as informações do DNA humano a fim de identificar variantes patológicas que estejam relacionadas ao quadro clínico do paciente.
A mensagem que eu gostaria de deixar aqui hoje é que as síndromes epilépticas podem ser associadas aos distúrbios do movimento, assim como o inverso. Especialistas e pacientes têm papéis a desempenhar neste processo de descoberta de uma doença, diagnóstico e tratamento, por isso precisamos nos munir de informações.
Este conteúdo visa informar e não substitui a orientação de um especialista. Consulte o seu médico para esclarecer quaisquer dúvidas e realizar diagnósticos.